Ao amanhecer, a cidade desperta sob o mesmo céu.
O sol nasce por igual para todos, mas seus raios encontram destinos desiguais.
Há ruas onde o asfalto reluz e jardins são podados com precisão britânica; há outras onde a poeira sobe com o vento e o esgoto corre a céu aberto, indiferente às promessas do progresso.
As desigualdades urbanas não são novidade, são heranças silenciosas que se ampliam com o tempo.
Nos bairros nobres, o silêncio é sinal de paz. Nas periferias, é prenúncio de abandono.
Enquanto alguns desfrutam de ciclovias e parques bem cuidados, outros lutam para conseguir transporte digno e água encanada.
A cidade se parte em zonas que, embora vizinhas no mapa, vivem realidades que jamais se tocam.
É comum ouvir que o espaço urbano é de todos, mas há quem viva como intruso na própria cidade.
Um jovem morador da periferia precisa acordar três horas antes do expediente para cruzar a cidade em ônibus lotados.
Já no centro, alguém corre no calçadão, ouvindo podcasts sobre qualidade de vida.
Ambos respiram o mesmo ar, mas o fazem de pulmões diferentes um mais cansado, outro mais livre.
Os centros comerciais crescem, os arranha-céus sobem, os condomínios fechados florescem como fortalezas modernas.
Dentro deles, segurança, saúde e lazer.
Fora deles, espera-se pela sorte, pela vaga no posto de saúde, pela rua que talvez um dia seja asfaltada.
O tempo, esse bem intangível, custa mais caro a quem tem menos.
Desigualdade urbana não é apenas um desequilíbrio geográfico, é uma arquitetura social, moldada por décadas de escolhas políticas, de prioridades invertidas, de invisibilidades forçadas.
Há quem diga que a cidade é viva.
Se for, ela é uma criatura estranha, que estende os braços a uns e vira o rosto a outros.
E assim segue o dia, com helicópteros cruzando o céu acima das comunidades, com buzinas nervosas nos semáforos das avenidas largas, com crianças brincando entre entulhos e outras em parquinhos coloridos.
A cidade não é uma só.
É uma colcha de realidades costuradas com fios que raramente se cruzam. Ao fim do dia, todos voltam para casa.
Uns em apartamentos climatizados; outros, em vielas sem saneamento. A noite cai como um véu sobre desigualdades que nunca dormem.
E a cidade, dividida e resistente, espera pelo próximo amanhecer onde tudo recomeça, igualmente desigual.
Autor:
CARLOS ALBERTO OMENA