*Por Rogério Gomes
O setor financeiro brasileiro vive uma transformação acelerada, impulsionada pela digitalização dos serviços e pelo avanço de soluções tecnológicas que remodelam a forma como crédito é ofertado, concedido e gerenciado. Entre essas inovações, o modelo Credit as a Service (CaaS) tem ganhado destaque como uma tendência promissora, especialmente em um país onde o o ao crédito ainda é limitado para uma parcela significativa da população. Esse modelo permite que empresas não financeiras — como varejistas, marketplaces, fintechs e até mesmo prestadores de serviços — ofereçam crédito diretamente aos seus clientes, sem a necessidade de se tornarem instituições financeiras.
No núcleo do modelo CaaS está a desverticalização dos serviços financeiros. Plataformas especializadas fornecem a infraestrutura tecnológica, a análise de risco, a originação e, em muitos casos, até mesmo os recursos financeiros para que marcas possam ofertar crédito de forma personalizada. Isso se traduz em jornadas mais integradas para o consumidor final, além de novas fontes de receita e fidelização para as empresas envolvidas. No entanto, embora o modelo traga vantagens evidentes, ele também enfrenta desafios significativos no cenário nacional.
Um dos principais obstáculos para a consolidação do CaaS no Brasil está relacionado à complexidade regulatória. Apesar dos avanços promovidos pelo Banco Central com o Open Finance e o estímulo à inovação via sandbox regulatório, o ambiente legal ainda exige cautela das empresas que desejam atuar no setor. A responsabilidade pela concessão de crédito impõe requisitos rígidos de compliance, governança, proteção de dados e gestão de risco — elementos que precisam ser endereçados por qualquer operação de CaaS com maturidade e estrutura.
Outro desafio relevante é a confiança. Ao permitir que empresas de diferentes segmentos ofereçam crédito, cria-se uma relação triangular entre o consumidor, a marca e o provedor de crédito por trás da operação. A clareza na comunicação, a transparência das condições e a experiência de uso são fatores essenciais para garantir que o cliente confie no processo e enxergue valor na oferta. Essa jornada do usuário, inclusive, tem sido um dos pontos de maior investimento das plataformas de CaaS, com o uso intensivo de inteligência artificial, UX design e dados comportamentais.
Por outro lado, o Brasil oferece um terreno fértil para a expansão do Credit as a Service. Com mais de 70 milhões de pessoas consideradas sub-bancarizadas ou desbancarizadas, existe uma demanda latente por soluções de crédito mais inclusivas e íveis. O CaaS tem o potencial de democratizar o o ao crédito ao permitir que empresas com forte capilaridade, como redes varejistas regionais e plataformas digitais, ofereçam financiamentos adaptados ao perfil do seu público. Ademais, o avanço da infraestrutura tecnológica, com APIs abertas, sistemas integrados e análise preditiva de dados, viabiliza uma concessão de crédito mais rápida, personalizada e segura.
As tendências para os próximos anos indicam uma sofisticação crescente do modelo CaaS. Entre os movimentos mais relevantes está a integração entre CaaS e Banking as a Service (BaaS), criando ecossistemas financeiros completos dentro de plataformas não financeiras. Também se observa uma intensificação do uso de dados alternativos — como comportamento de compra, histórico de navegação e interações com marcas — para compor scores de crédito mais precisos, especialmente para consumidores que ainda não possuem histórico bancário tradicional. A interoperabilidade promovida pelo Open Finance tende a acelerar ainda mais esse processo.
Portanto, o Credit as a Service no Brasil surge como uma resposta moderna e estratégica para os desafios do sistema de crédito tradicional. Embora ainda enfrente barreiras regulatórias, culturais e tecnológicas, sua capacidade de inclusão financeira e sua adaptabilidade às demandas de um consumidor cada vez mais digitalizado o colocam como uma das principais apostas do futuro dos serviços financeiros. O sucesso do CaaS dependerá, sobretudo, da construção de parcerias sólidas, da confiança do consumidor e de um ecossistema regulatório que acompanhe a velocidade da inovação.
*Rogério Gomes é superintendente da AutoBanking, plataforma inovadora de crédito como serviço (CaaS), focada em oferecer soluções financeiras personalizadas para concessionárias de veículos. Executivo sênior com mais de 27 anos de atuação em empresas de médio e grande porte em diferentes segmentos (bancário, financeiro, varejo e tecnologia), Rogério possui participação em projetos de planejamento estratégico, melhorias de processos, reestruturação de áreas/equipes e fusão de empresas.