Nas primeiras horas da manhã, quando a cidade ainda boceja entre postes acesos e calçadas úmidas de sereno, há quem já esteja de vassoura em punho, balde ao lado, corpo curvado sobre o que deixamos para trás.
São homens e mulheres que am por nós sem nome, sem rosto, sem história a quem chamamos, no máximo, de garis.
Invisíveis.
Eles chegam quando ainda estamos recolhidos em nossos travesseiros e partem antes que notemos seu trabalho.
O que sobra é a ilusão de uma cidade limpa por magia.
Ninguém vê o suor que escorre por dentro do uniforme laranja, a paciência com que se varre bituca por bituca, papel por papel, esperança por esperança.
Nas calçadas, o rastro da pressa cotidiana: embalagens de fast food, garrafas plásticas, máscaras descartadas, o resto de tudo aquilo que consumimos e esquecemos.
A cada manhã, os invisíveis da cidade recolhem não apenas o lixo, mas também a indiferença de quem nunca lhes dirige um olhar.
Eles têm nome, sabem sorrir, contam piadas entre si enquanto dividem o peso do mundo em sacos pretos.
Têm filhos que esperam em casa, boletos que vencem no fim do mês e sonhos que, por vezes, cabem em intervalos curtos entre uma coleta e outra.
Quando a cidade desperta, já está limpa. Mas ninguém aplaude.
O mérito se dissolve como a poeira aspirada pelas máquinas. São os heróis urbanos sem capa e, ironicamente, sem palco. Talvez fosse hora de parar e enxergar.
De dizer “bom dia”, de agradecer.
Porque os invisíveis da cidade estão ali todos os dias, limpando o que sujamos, consertando o que estragamos, dando dignidade ao espaço que pisamos mesmo quando negamos a eles essa mesma dignidade.
E amanhã, antes do sol nascer, estarão lá de novo. Invisíveis.
Essenciais…
Autor:
CARLOS ALBERTO OMENA