Outro dia, no escritório, dona Jacira me ligou, aflita. Não era por conta do andamento do processo. Era o extrato do banco. Três seguros que ela nunca soube ter contratado. Um era “Proteção Vida ”, outro “Seguro Roubo de Cartão”, e o terceiro — esse até bonito no nome — “Tranquilidade Garantida”. Só que tranquila, mesmo, só estava a instituição financeira.
É impressionante — e revoltante — a maneira como a indústria bancária normalizou a venda casada. Nos últimos tempos, então, virou epidemia: onde há um empréstimo consignado, há um seguro embutido. E onde há um idoso, há três contratos para — sendo que ele só foi ao banco pedir ajuda para consertar o telhado.
A armadilha não está no produto, está na sutileza. Oferecem como se fosse proteção, um cuidado, quase um gesto de carinho: “Para a sua segurança, dona Jacira”, dizem. E colhem a biometria. Mas o que se vende não é segurança, é a captura. E a vem junto com o empréstimo, camuflada entre cláusulas que ninguém explica.
A vítima perfeita? Quem não tem tempo, nem estudo, nem desconfiança. Pessoas simples, muitas vezes sozinhas, que confiam no banco como sempre confiaram nas outras pessoas.
A verdade é que essas instituições encontraram um novo filão: o da vulnerabilidade. Não é só um produto a mais no catálogo. É um esquema que se alimenta da boa-fé e tem como pano de fundo uma classe enorme de pessoas. Um produto tipicamente brasileiro.
Dona Jacira, coitada, ainda tentou cancelar. Deram-lhe um número de protocolo e um prazo de 45 dias úteis. E enquanto isso… já trocou de calendário, algumas vezes. E segue resignada em sua vida de brasileira.
Dr. Alexandre Triches
Advogado e professorhttps://schumachertriches.com.br/