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sexta-feira, 23 de maio de 2025

Mãe Visceral, Pai Reprodutor

Homens abortam? Josualdo Alves Martins é um jovem 

mecânico de 24 anos. Nasceu sem conhecer o pai. Na certidão de nascimento consta o nome de seu progenitor: João 

Neves Martins. Dona Leda Alves, sua mãe, sempre afirmou 

não saber o paradeiro do pai, visto ter sido abandonada por 

João com oito meses de nascido o Josualdo.

O filho crescera forte e recebera de sua mãe todo esforço para ser bom homem. Menino ainda, aos 10 anos, nasceu 

nele a necessidade e a ânsia de procurar o pai. Sentia vergonha em não poder apresentá-lo nas cerimonias do colégio. 

Nas partidas de futebol, todo mundo tinha, na torcida, um 

pai. Dona Leda procurava compensar a ausência, mas ele era 

o filho do vento, um filho sem pai!

Nem Dona Leda e nem Josualdo sabiam que ali bem perto deles morava o João Neves. Depois de ter abandonado a 

mulher há décadas, o João, Pé de Vento, como era conhecido, 

tinha percorrido o Brasil quase todo. Não parava em lugar nenhum por mais de dois anos. Ia atrás de aventuras e emprego. 

Parecia cigano, sem pouso seguro.

Pois é, o Pé de Vento, morava no mesmo bairro que a sua 

progênie. Mas nunca procurou saber do Josualdo. O ado 

estava morto em seu coração. Depois de muitos tropeços, o 

João nem sabia quantas mulheres grávidas ele tinha abandonado.

O destino, se é que existe tal coisa, é, dizem, uma trama 

de vários cruzamentos. No copo e na vida, devemos beber o 

conteúdo até a última gota. E assim foi

– Arrasta a cadeira aí e senta, vamos beber! – Disse João.

– Não posso, tenho que seguir para casa. Não tenho todo 

o seu tempo à desperdiçar em um bar. – Tentava se desvencilhar o outro.

– Meu irmão preciso te falar…É coisa séria! Estou gravemente doente e preciso de um lugar para morar… Não posso 

mais morar sozinho, preciso de alguém que cuide de mim.

– Você quer uma mulher ou uma empregada? – Apontava 

o seu ex companheiro de esbórnia.

– A gente faz as escolhas erradas e depois, quando velho e 

doente, não tem quem nos estenda a mão…

O outro que não era um bom ouvinte, saiu de fininho. 

João bebeu mais dois copos, pegou o chapéu na mesa, ajeitou 

as roupas e saiu meio tonto e cambaleante.

A aposentadoria mal dava para pagar as suas despesas. 

Novo ainda em seus 67 anos mas diabético, precisava urgente 

de arranjar um lugar para pousar as suas misérias: as físicas e 

as morais.

D. Leda ainda estava em pleno viço nos seus 53 anos. Só 

teve um filho em sua vida, Josualdo. Ele sem pai, ela sem marido seguiu em frente quando abandonados. Ela pegou o touro à unha. Quando caia, levantava.

D. Leda era muito orgulhosa de si mesma. Quando olha 

para o filho, vinha nela uma triunfante sensação de missão 

bem cumprida. O filho era a sua riqueza, apesar de estarem

nos extratos mais baixos de uma classe média.

– Josualdo, você vem pro almoço?

– Não, mãe. Preciso finalizar uns consertos que já estão 

com a data de entrega atrasados.

– Mas não exagera, volta cedo!

Logo que Josualdo saiu, mais meia hora, D. Leda saiu também. Precisava fazer umas compras no mercadinho do bairro. 

Pegou a lista de compras e saiu a pé. Mal sabia o que a esperava: um susto ou uma maldição?

Como sempre fazia pegou o caminho por trás da sua casa, 

o que era o mais curto. Foi meio distraída, subia e descia as 

calçadas. ou na banca de jornal, na frente do mercadinho 

e, o seu coração bateu acerelado! Não podia ser ele!… Mas 

desgraçadamente era o João, o das tristes memórias. A triste 

figura estava encostado na banca de jornal, lendo um jornal 

popular. O seu coração bateu aos saltos!

O que fazer? O susto foi tão grande que chegou a despertar a atenção do João, que não a reconheceu, mas que sorriu 

um sorriso cafajeste: viu assombração, dona? Ela se esquivou 

e saiu pra dentro do mercado. Ele a acompanhou com o olhar.

D. Leda precisava se recuperar. Sentou-se numa cadeira 

e tomou um refrigerante gelado. Quando se recuperou saiu 

pela porta dos fundos do mercado.

Andou com pressa, quase correu! Chegou em casa esbaforida. Oh, meu Deus! Oh, meu Deus! Não posso voltar aquele 

inferno de vida! Quantas e quantas noites deixei de dormir

pensando naquele desgraçado? Mesmo antes dele desaparecer, sumir pelo mundo, o meu sofrimento foi grande. Ele ava noites inteiras fora de casa. Mesmo grávida, eu não podia 

contar com ele. Não, não! Eu não mereço voltar ao inferno!

Decidida e altiva, D. Leda engoliu o pão mofado de um 

amor insepulto e seguiu a sua vida. Nada disse ao Josualdo 

que continuou ignorando o paradeiro do pai. 

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